domingo, 18 de agosto de 2013
Além de Amarildo, Rio tem 3 casos famosos de sumiço sem solução em 10 anos
Desaparecido há mais de um mês, o ajudante de
pedreiro Amarildo de Souza , 43, levado por
policiais militares para averiguação em um posto
da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da favela
da Rocinha, zona sul da cidade, é o quarto caso a
se tornar um símbolo nacional da luta contra a
violência no Estado --a engenheira Patrícia
Amieiro, a irmã do lutador Víctor Belford e a
chinesa Ye Guoe. Ainda sem informações oficiais
da polícia sobre o paradeiro de Amarildo,
familiares esperam pelo desfecho do caso.
"No homicídio, você enterra o corpo, fecha um
ciclo. A gente ia enterrar e com o tempo, quem
sabe, poderia entender [o caso] com mais frieza.
Com o desaparecimento, a família fica arrasada
por não ter o corpo", afirmou o administrador
Adriano Amieiro, irmão da engenheira Patrícia
Amieiro, desaparecida desde junho de 2008.
Ela voltava de um show na Urca, zona sul do Rio,
para casa, na Barra da Tijuca, zona oeste da
cidade, quando desapareceu. O carro que ela
dirigia, um Fiat Palio, foi encontrado no Canal de
Marapendi, que cruza a autoestrada Lagoa-Barra.
O caso foi tratado como acidente no início das
investigações, mas a hipótese foi descartada após
técnicos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli
encontrarem marcas de tiros no capô e no
interior do carro da engenheira.
Segundo o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
dois policiais militares que estavam na área na
época do crime são acusados pela morte de
Patrícia. Outros dois são suspeitos de fraude no
processo.
Em julho deste ano, o TJ decidiu que os quatro
serão levados a júri popular. Cabe recurso da
decisão, e o julgamento ainda não tem data para
ser realizado. Os policiais aguardam em
liberdade.
"A gente se reuniu duas, três vezes com o
[governador Sérgio] Cabral e com o [Secretário
de Estado de Segurança Pública José Mariano]
Beltrame. Eles chamam para conversar, mas
querem que o caso caia no esquecimento, para
livrar os policias", diz o irmão de Patrícia. "Eu falei
pra família do Amarildo: isso é rotina deles, eles
têm essa malícia de chamar para conversar, dizer
que está do lado e depois vai sumindo quando o
caso vai abaixando."
A morte presumida da engenheira foi declarada
em junho de 2011. Segundo o TJ-RJ, as
declarações não deixavam resquício de dúvida de
que Patrícia possuía vínculos muito estreitos com
seus familiares e amigos, além de a foto do carro
dela e o local onde foi encontrado indicarem que
a jovem não poderia ter saído viva do veículo, já
que na havia marcas de bala.
"Vários Amarildos"
"Existem vários Amarildos que precisam do
mesmo apoio da sociedade. Colocando foto,
ligando para o Disque-Denúncia, se engajando e
ajudando a procurar", diz Jovita Belfort, mãe de
Priscila Belfort, desaparecida há nove anos . Em
janeiro de 2004, Priscila, irmã do lutador Víctor
Belfort, saiu da Secretaria de Esportes e Lazer, no
centro do Rio de Janeiro, onde trabalhava,
dizendo que ia almoçar, e nunca mais foi vista.
Ela tinha 29 anos.
Na época, as investigações apontavam para um
sequestro, mas a família afirmou nunca ter
recebido pedido de resgate. "Recebemos duas
ligações de oportunistas, que tinham visto a
repercussão do caso", conta a mãe de Priscila.
Apesar disso, a polícia trabalha com a informação
de que ela foi morta no Morro da Providência, na
região central do Rio. O processo não foi
arquivado e corre em segredo de Justiça até hoje.
"O fim [para o caso] que eu quiser inventar
dentro do meu coração pode ser. Esse tipo de
desaparecimento é um dos mais difíceis.
Segundo especialistas, pelo tempo que já tem, ela
deve ter sofrido um sequestro relâmpago que
teve um desfecho ruim", afirma. "Pode ter
acontecido tráfico de pessoas ou ela ter sofrido
alguma violência que resultou em uma perda de
memória. Para falar a verdade, tem dias e dias na
minha vida. Em alguns, eu acordo e penso em
uma hipótese e em outros, acho que aconteceu
outra coisa."
Em março deste ano, a polícia do Rio prendeu
um homem sob suspeita de participar do
sequestro de Priscila. Leandro Ferreira Fernandes,
o Periquito, era foragido da Justiça desde 2010.
Ela já tinha sido preso em 2006 por suspeita de
participação neste crime, mas obteve o benefício
de visita periódica ao lar e não voltou ao presídio.
Policiais condenados
Já a chinesa Ye Guoe desapareceu em julho de
2008, depois de sair de um shopping na Barra da
Tijuca com US$ 130 mil na bolsa. Ela havia sido
vista por um taxista sendo levada em uma viatura
policial antes de desaparecer.
Em junho de 2009, o juiz André Ricardo Ramos,
da 28ª Vara Criminal do Rio, condenou quatro
policiais, dois civis e dois militares, a uma pena de
12 anos de reclusão pelo roubo triplamente
circunstanciado (emprego de arma, concurso de
pessoas e retenção da vítima).
Marcelo Gomes da Costa, Fabiano do Amaral
Bernardes, Cláudio Rodrigues de Azevedo e Izan
Chaves de Mello foram absolvidos da acusação
de ocultação de cadáver. O corpo, no entanto,
nunca foi encontrado.
Cinco funcionários de uma casa de câmbio onde
a chinesa esteve foram acusadas de falso
testemunho e absolvidas, mas a acusada Graziele
Oliveira de Farias foi condenada pelo crime a uma
pena de um ano e dois meses de reclusão, que
foi convertida em multa e prestação de serviços
comunitários. Eles haviam omitido a passagem de
Ye, já que o estabelecimento não tinha
autorização para comercializar dólares.
Denúncias
Segundo a mulher do pedreiro, Elizabete Gomes,
Amarildo foi levado por PMs da porta da casa
onde o casal mora com os seis filhos até o posto
da UPP. De acordo com o comandante da
unidade, major Edson dos Santos, ele foi liberado
em seguida, quando se constatou que ele havia
sido confundido com outra pessoa, e deixou o
local caminhando. O pedreiro nunca mais foi
visto.
Na semana passada, o ex-delegado adjunto da
15ª DP, Ruchester Marreiros, pediu a prisão
preventiva da mulher de Amarildo. Nas suas
investigações, ele indicava o envolvimento do
casal com o tráfico na comunidade. O relatório
foi desconsiderado pelo delegado titular da 15ª
DP, Orlando Zaccone.
"Para levantar dúvidas na população, tenta-se
incriminar a vítima. Quando a minha irmã
desapareceu, disseram que ela era viciada em
drogas e que frequentava a Rocinha, para
desmoralizar. Como ela era engenheira de uma
multinacional, não teve como continuar com
isso", conta o irmão de Patrícia Amieiro.
"O governador escolhe o secretário de
Segurança, que decide a chefia da Polícia. Em
muitos lugares, a perícia não é independente.
Vira uma cadeia de corporativismo", afirma o
irmão de Patricia Amieiro. "A gente fez muita
manifestação, nunca deixamos cair no
esquecimento. O caso do Amarildo teve comoção
popular, pegou a onda da manifestação, por isso
teve repercussão."
Para a mãe de Priscila Belfort, o Estado deveria
contar com delegacias especializadas em
desaparecidos. "Hoje, você faz o registro. Até ser
chamada, já levaram a pessoa para muito longe.
Com números absurdos de gente desaparecida,
isso já tinha que existir há muito tempo, com
investigadores especializados e que agissem
rápido", disse Jovita. "Uma pessoa, pelo menos,
nesse mundo sabe o que aconteceu: a que
sequestrou ou matou. Eu não sei."
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