Sentado numa cadeira debaixo de uma árvore
no vasto jardim de uma casa em Pasadena,
subúrbio abastado de Los Angeles, Sacha
Gervasi, o diretor de "Hitchcock", gagueja um
pouco quando é perguntado sobre como se
sentiu ao dirigir dois monstros sagrados:
Anthony Hopkins e Helen Mirren, dentro de
um filme sobre a vida de Alfred Hitchcock.
"Fiquei intimidado. Tenho que admitir. É claro
que fiquei intimidado. Tudo neste projeto dá
um frio na barriga", diz o cineasta.
Nascido na Grã Bretanha, Gervasi reside nos
Estados Unidos desde que se formou em
cinema pela Universidade da Califórnia em
Los Angeles (UCLA). Tornou-se conhecido em
2008 graças ao documentário "Anvil: The
Story of Anvil", no qual mostrava a vida de
uma obscura banda de rock pesado e sua luta
para sobreviver depois de um brevíssimo
estrelato.
Fã de Hitchcock desde os tempos de
faculdade, Gervasi não perdeu a chance
quando soube que a Montecito Picture
Company, dona dos direitos do livro "Alfred
Hitchcock and the Making of Psycho", estava
procurando diretores para o projeto. "Lutei
pela oportunidade", Gervasi conta. "Fiz um
teste, como os atores fazem. E parte do meu
teste era dizer quem eu escalaria para o papel
principal. Na minha cabeça, só havia uma
pessoa: Anthony Hopkins."
Gervasi vai mais adiante para justificar a
escolha. "Não é só porque ele e Hitchcock
têm as mesmas iniciais e foram ambos
tornados cavaleiros pela Rainha. É porque um
papel tão complicado como este só poderia
mesmo ser confiado a Anthony Hopkins",
afirma.
Desprezo por atores
"Conheci Hitchcock pessoalmente", diz
Anthony Hopkins durante um intervalo das
filmagens, ainda com a pesada maquiagem
que aproxima suas feições das de Hitchcock.
Cada aplicação levou "duas horas, talvez um
pouco mais" e foi repetida durante todas as
manhãs no set.
"Tínhamos o mesmo agente em certo
momento de nossas carreira. George Chasin,
ele nos apresentou", lembra o ator sobre o
encontro com o cineasta. "Já era o grande
Hitchcock e eu, um jovem ator querendo
saber o que faria da minha carreira."
Hopkins ainda conta que Hitchcock já tinha
dito que atores deviam ser tratados como
gado. "Desprezava atores na linha do
'método', porque sua câmera sempre era
capaz de captar a verdade. Foi um pouco
assustador [o encontro]", afirma.
Descobrindo Hitchcock
Gervasi adaptou o livro e colocou o foco do
filme no período entre 1959 e 1960, quando
Hitchcock se encantou com o livro de terror
"Pyscho", de Robert Bloch, pouco tempo
depois do sucesso de "Intriga
Internacional" (1959). Bloch, por sua vez, se
inspirou nos crimes verdadeiros e hediondos
do serial killer Ed Gein.
"Psicose", um clássico do filme de suspense,
nasceu entre uma guerra de nervos com o
estúdio, complicações de saúde, dramas entre
suas estrelas Vera Miles (Jessica Biel) e Janet
Leigh (Scarlett Johansson) e as complexidades
dos desejos de Hitchcock.
"Nunca na verdade soube quem Hitchcock
era", diz Hopkins. "Além daquele encontro
rápido, acompanhei sua carreira como todo
fã de cinema, na plateia. Emocionalmente,
psicologicamente, ele era opaco. Muitas
pessoas tinham horror a ele. Outras, como
Janet Leigh, por exemplo, achavam-no muito
divertido, um gozador."
Admirado pela figura do diretor, Hopkins
afirma que gostaria de ter sido amigo de
Hitchcock. "Psicologicamente, eu não tinha
muita informação para montar o personagem
além do óbvio talento, da certeza com que
tomava as decisões importantes, de como ele
criava sua obra, e da sua coragem para
quebrar regras e lutar por sua visão."
Justiça à Alma
Uma figura central no filme, na vida de
Hitchcock e na criação de "Psicose" é Alma
Reville. Esposa, montadora e assistente de
direção, a companheira do cineasta é
interpretada por Helen Mirren. "Acima de
tudo, o que existia entre eles era uma
verdadeira história de amor", diz a atriz.
"Com todas as complicações, os altos e baixos
e as imperfeições de uma história de amor.
Alma era sua principal colaboradora. Mais
que isso, ela era o sustento, o eixo central de
Hitchcock."
Para criar sua versão de Alma, Helen
inspirou-se na biografia "Alma Hitchcock",
escrita por Patricia, a única filha de Alma e
Alfred. "É revelador que Patricia não tenha
escrito sobre seu pai, o que pareceria mais
óbvio, mas sobre sua mãe", diz Helen. "Só
isso já diz muita coisa. Embora Patricia adore
seu pai, o livro é um retrato muito positivo,
muito amoroso de Alma."
Entre os pequenos detalhes que Mirren
descobriu sobre a vida de Alma e Hitchcock
estão as obsessões da família com carros e
comida. "Deve ter sido uma ousadia para
esses dois ingleses, que adoravam a
Inglaterra, se mudarem para uma cidade do
oeste norte-americano", diz.
Helen também defende a postura do filme em
reconhecer a importância de Alma. "Acho que
ela jamais recebeu o crédito merecido",
afirma. "Ela não é uma mera nota ao pé de
página da biografia de Hitchcock. Foi sua
parceira, sua colaboradora, diretamente
envolvida em todas as etapas de seu processo
de criação. Espero que este filme pelo menos
comece a corrigir isso."
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