O ex-prefeito de Blumenau
(139 km de Florianópolis) João
Paulo Kleinubing (PSD), atual
presidente do Badesc (Banco
de Desenvolvimento de Santa
Catarina), confirmou em nota divulgada nesta
terça-feira (30) que manteve diálogo com o
ex-secretário de Obras Alexandre Brollo, no
qual teria mandado seu subordinado criar um
documento falso para simular um processo de
dispensa de licitação.
A fraude seria para permitir que a empresa
municipal URB (Companhia Urbanizadora de
Blumenau) recebesse uma verba de R$ 30
milhões do Badesc (Banco de
Desenvolvimento do Estado de Santa
Catarina).
Na nota, o ex-prefeito, embora tenha
confirmado a conversa, disse que o contrato
foi assinado no dia seguinte à conversa
(6.jul.2012), e não com data retroativa. "Não
assinei contrato retroativo. E todos os
contratos feitos pela URB foram abaixo dos
valores de referência. Tudo o que foi
divulgado hoje são informações não
verdadeiras", afirmou Kleinübing, em nota
(veja no final do texto a íntegra da nota).
O ex-prefeito disse ainda que não foi
chamado pelo MP para prestar
esclarecimentos e que tomará medidas
judiciais para esclarecer os fatos.
Segundo as investigações, os projetos para as
obras citadas na conversa, porém, não
estavam prontos, e Kleinubing ordenou
também que o ex-secretário de Obras
Alexandre Brollo inventasse os projetos.
A gravação do diálogo integra as investigações
da Operação Tapete Negro, que apura a
existência de um megaesquema de corrupção
montado em Blumenau e que teria causado
um prejuízo aos cofres públicos de, pelo
menos, R$ 100 milhões.
Na sessão de hoje na Câmara Municipal de
Blumenau, o vereador Jefferson Forest (PT) fez
um apelo aos parlamentares para que abram
uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI)
para investigar o esquema de corrupção.
Foro privilegiado
Após o "forte indício de ilicitude cometida
pelo prefeito", porém, o MPE passou também
a investigar Kleinubing. Em virtude de sua
condição de prefeito, Kleinubing gozava de
foro privilegiado, o que fez com que as
investigações fossem encaminhadas à
Procuradoria-Geral do Estado.
A ordem do prefeito pode ser melhor
compreendida dentro do contexto do esquema
criminoso que estaria instalado em
Blumenau.
De acordo com as investigações do MPE, a
principal forma utilizada pela quadrilha para
lesar o patrimônio público seria o desvio de
dinheiro por meio de obras superfaturadas e
contratadas por meio de licitações
fraudulentas. O esquema se daria
principalmente em obras tocadas pela URB.
Por conta de uma legislação municipal, a
empresa pública tem a prerrogativa de
contratar com o município por meio de
dispensa de licitação, desde que comprove,
mediante tomada de preços, que os
orçamentos que apresenta são compatíveis
com aqueles praticados pelo mercado.
A fraude, então, teria início na comparação de
orçamentos, contando com a participação de
empreiteiras privadas que apresentavam
intencionalmente preços superiores aos
oferecidos pela empresa estatal. Dessa
maneira, a URB ganhava o direito de realizar
a obra por um custo, aparentemente, mais
baixo que os de seus concorrentes privados,
para depois terceirizar os trabalhos para as
mesmas empresas envolvidas, só que por um
preço menor.
A diferença entre o que o a prefeitura paga à
estatal e o que esta repassa às empresas
subcontratadas seria dividida entre os
participantes do esquema.
PREFEITO SOB INVESTIGAÇÃO
No caso específico em que o ex-prefeito
ordenaria a fraude, o município de Blumenau
pleiteava uma verba de R$ 30 milhões do
Badesc proveniente do programa de fomento
estadual "Asfalto Pra Gente", que financia
obras de pavimentação em cidades
catarinenses.
À época do diálogo interceptado entre o então
prefeito e seu secretário, dia 5 de julho de
2012, Kleinubing tinha até 31 de agosto
daquele ano para enviar ao Badesc os projetos
de obras de pavimentação para pleitear a
verba.
No dia da conversa interceptada, porém,
Kleinubing veio a saber que, em virtude de um
entendimento do BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social) sobre a
natureza jurídica e sobre as regras para a
concessão do financiamento, a data final para
o envio dos projetos ao banco era 7 julho, ou
dois dias a partir dali, e já com os projetos
definidos e as obras devidamente licitadas e
com ordens de serviços expedidas.
ENTENDA O ESQUEMA
A prefeitura, porém, possuía apenas esboços
de projetos, sendo que só um deles já contava
com valores e medições em fase quase
concluídos.
Assim, para não perder a verba estadual, com
a qual o prefeito e seu grupo político
contavam para realizar obras tidas como
essenciais para fins eleitorais (a eleição
municipal ocorreria em outubro daquele ano),
Kleinubing decidiu ordenar que o secretário
de Obras criasse um processo de dispensa de
licitação fictício em favor da URB com data
retroativa, além de uma ordem de serviço
com data de 5 de julho, o dia em que é
travado o diálogo.
Também seria necessário enviar ao Badesc os
projetos das obras de pavimentação
supostamente produzidos pela URB, mas eles
não existiam ou não estavam concluídos. A
solução encontrada pelo então prefeito,
assim, foi fraudar toda essa documentação,
inclusive criando simulacros de projetos de
obras, para o que solicitou ajuda do então
presidente da URB, Eduardo Jacomel,
apontado como um dos comandantes do
megaesquema de corrupção, conforme
demonstra o diálogo interceptado pelo MPE:
Ex-prefeito João Paulo Kleinubing: "Alô,
Brollo?"
Ex-secretário de Obras Alexandre Brollo:
"Oi."
Kleinubing: "Conhece a definição do termo
'fodeu'?"
Brollo: "Ai, meu Deus."
Kleinubing: "Fodeu, fodeu, vais entender,
fodeu."
Brollo: "Certo."
Kleinubing: "Falei com o Nelson agora, né?,
do Walfredo me provocou agora, algum
luminar do BNDES mandou correspondência
pro Badesc, advogado, advogado merda,
advogado merda, equiparando operação de
crédito a transferência voluntária de recurso."
Brollo: "Fodeu."
Kleinubing: "Ou seja, o prazo não é mais 31
de agosto, mas 7 de julho."
Brollo: "É depois de amanhã."
Kleinubing: "Deve estar licitada e com ordem
de serviço emitida. Isso é a definição do
termo 'fodeu', né?"
Brollo: "Sim."
Kleinubing: "Então, fodeu."
Brollo: "Puta que pariu."
Kleinubing: "Então, Brollo, preciso trazer tu e
o Jacomel [Eduardo Jacomel, então presidente
da URB] pra cá."
Brollo: "Sim."
Kleinubing: "E assim, ó: dispensa pra URB,
com data atrasada e ordem de serviço com
data de hoje."
Brollo: "Tá bom, tô ligando pro Jacomel e tô
indo pra aí."
Kleinubing: "De projeto que não existe."
Brollo: "Não, até existe, né?"
Kleinubing: "É, só que assim, naturalmente,
Brollo, porque eu preciso que vocês dois
venham aqui. Eu não vou fazer isso para R$
20 milhões, nem faz..."
Brollo: "Não, claro, claro, claro, mas tem
mais ou menos as obras que eles poderiam
fazer lá."
Kleinubing: "Isso, a questão é: o que que, de
fato, o que nós vamos priorizar, o que nós
temos capacidade de execução, pra começar
agora, e essa nós vamos encaminhar. Nós
vamos fazer de tudo, né, também..."
Brollo: "Não, não, mas isso aí... Isso aí tem,
mais ou menos nós já temos."
Kleinubing: "Pra gente trabalhar nisso."
Brollo: "Meia-hora aí."
Kleinubing: "Meia-hora aqui."
Íntegra da nota de Kleinubing
Em relação à matéria publicada no site
UOL, no dia de hoje, e à investigação do
Ministério Público, na chamada Operação
Tapete Negro, o ex-prefeito João Paulo
Kleinubing esclarece a bem da verdade:
1 – As notícias publicadas não
correspondem à verdade dos fatos, são
irresponsáveis e já foram divulgadas no
final do ano passado;
2 – O que de fato existe é uma apuração
do Ministério Público Estadual baseada em
suposições construídas em cima de
informações não verdadeiras;
3 – O Ministério Público não ofereceu
denúncia contra qualquer pessoa;
4 – Nenhuma pessoa foi indiciada, muito
menos o ex-prefeito João Paulo Kleinubing;
5 – Não houve qualquer tipo de fraude e
não foi provada a existência de qualquer
tipo de fraude: a contratação da URB –
Companhia Urbanizadora de Blumenau -
pela Prefeitura é um procedimento legal;
6 – Não houve superfaturamento de
qualquer obra realizada ou contratada pela
URB – durante a gestão do prefeito João
Paulo Kleinubing;
7 – Todas as obras referidas foram
contratadas e executadas abaixo dos
preços de mercado e abaixo dos preços de
referência oficiais apresentados nas
tabelas federais do SICRO e SINAP e
estadual, do DEINFRA;
8 – Por preceito legal, a URB era
contratada através de dispensa de
licitação, modalidade prevista em lei,
porque a Companhia pertence à Prefeitura
e pode ser contratada através dessa
modalidade, desde que efetue preços
compatíveis com o mercado, o que de fato
sempre ocorreu;
9 – O suposto superfaturamento de obras
apontado na matéria do UOL e na ação do
Ministério Público teria sido feito para
beneficiar a URB, que é uma empresa da
Prefeitura, ou seja, a beneficiada seria a
própria Prefeitura, o que é no mínimo
incoerente e sem fundamento;
10 – Nem a reportagem, nem a ação do
Ministério Público apontam como teria sido
desviado o dinheiro da URB, coisa que de
fato não aconteceu;
11 – A matéria aponta, de forma
inverídica, o desvio de R$ 100 milhões
através da URB, mas não diz que os
contratos realizados pela prefeitura com a
URB para execução de obras somam R$ 58
milhões de 2006 a 2012, período da
apuração do Ministério Público;
12 – Nenhuma empresa e nenhuma pessoa
foi favorecida no suposto esquema
apontado pela reportagem;
13 – Nenhum contrato foi assinado com
data retroativa;
14 – Todos os contratos com o Badesc
foram assinados dentro dos prazos
previstos em lei e as datas comprovam
isso;
15 – Nenhum documento foi fraudado;
16 – O uso maldoso de gravações fora do
devido contexto é um artifício que deve
ser repudiado. Naquele momento, a
Prefeitura de Blumenau corria o risco de
perder R$ 15 milhões por conta de
entraves burocráticos, mesmo assim,
nenhum contrato, dispensa de licitação ou
ordem de serviço foi assinado com data
retroativa, conforme sugere a reportagem;
17 - A conversa foi citada na reportagem
foi realizada no dia 5 de julho de 2012 e
todos os documentos foram assinados em
data posterior, o que é de fácil
comprovação;
19 – O ex-prefeito João Paulo Kleinubing
reafirma que não houve desvio de recursos
públicos e não houve prejuízo aos cofres
públicos e tomará as medidas judiciais
necessárias com relação à matéria do UOL;
20 – O ex-prefeito João Paulo Kleinubing
jamais foi chamado pelo Ministério Público
para prestar qualquer esclarecimento e
está totalmente à disposição do MP para
as informações que forem necessárias.
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